André Petry, na VEJA 1996, 21/02/07:
“O que funciona é a certeza da punição. Portanto, ninguém precisa levantar a bandeira da pena de morte, da cadeira elétrica, da prisão perpétua. Isso é coisa do botãozinho mental”
Em alguns círculos da sociedade brasileira, nos quais se inclui uma penca de parlamentares, deve existir um botãozinho mental que é acionado sempre que acontece um crime bárbaro – é o botãozinho mental do aumento de pena. Um assassinato comove o país? O botãozinho mental defende uma lei prevendo pena maior para os assassinos. Um seqüestro provoca indignação geral? O botãozinho mental quer pena maior para seqüestradores. É sempre assim. Um menor participou do assassinato brutal do menino João Hélio? O botãozinho mental comparece defendendo pena maior para o menor. Agora, a Câmara aprovou um projeto em resposta ao assassinato de João Hélio: dobra a pena para quem alicia menores de 18 anos para suas atividades criminosas. Anotem aí: a medida pode ter o mérito de dar uma satisfação à sociedade, uma resposta à indignação coletiva, mas não vai resolver coisa nenhuma.
O dado intrigante é que todo mundo sabe – os especialistas já disseram isso dezenas, centenas, inúmeras vezes – que aumento da pena não reduz a criminalidade, não dissuade o criminoso. O Brasil já produziu exemplos claros desse ilusionismo. Diante do aumento de crimes como seqüestro ou estupro, veio a lei dos crimes hediondos, talvez a nossa mais vistosa jabuticaba jurídica. O objetivo tinha o equívoco de sempre: reduzir os crimes hediondos ao prever punição mais rigorosa. Não adiantou nada. Em 1990, cresciam os seqüestros no Rio de Janeiro – chegaram a trinta naquele ano –, e então seqüestro virou crime hediondo. Dois anos depois, os seqüestros no Rio haviam quadruplicado… Em 1996, houve 8.000 casos de estupro no país. Virou crime hediondo. No ano seguinte, foram 14.000…
O que funciona no combate ao crime – e os especialistas também já disseram isso inúmeras vezes – não é o tamanho da pena, mas a certeza da punição. Portanto, ninguém precisa levantar a bandeira da pena de morte, da cadeira elétrica, da prisão perpétua. Isso é coisa do botãozinho mental. O que funciona é levantar a bandeira da punição: que o criminoso seja encontrado, julgado, condenado e cumpra a pena a que for condenado. Só – ou tudo – isso. O Brasil precisa parar o carrossel da impunidade. É na vastidão da impunidade que está o veneno. E que ninguém se iluda: a impunidade no Brasil não beneficia só ricos e brancos. Acolhe também pretos e pobres, ainda que eles sejam a população que lota os presídios. A impunidade brasileira, que ninguém se iluda, é democrática.
É fácil dizer que a impunidade resulta da incompetência da polícia, da morosidade da Justiça. Isso é verdade, mas sua raiz está na falta de coesão da sociedade. Numa terra em que o estado chegou antes da nação, os botocudos clamam por punição quando os atingidos pertencem ao próprio grupo. É um fenômeno interessante do ponto de vista sociológico, ainda que seja repulsivo do ponto de vista ético. Advogados se chocam com a morte de advogados. Cariocas se chocam com a morte de cariocas. Sim, o Brasil ficou chocado com a morte de João Hélio. Isso também é verdade. Mas cadê a missa de sétimo dia na Catedral da Sé em São Paulo? Cadê a passeata nas ruas de Belo Horizonte ou Brasília? Cadê o minuto de silêncio nos estádios de Porto Alegre ou Salvador?”
Luiz Fernando R. de Sales
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